Está um calor de morte em Coimbra. Nas ruas, nas esplanadas, em minha casa e na casa dos outros. As janelas abertas não resolvem, porque não há vento - e quando há, é quente. Logo pela manhã já uma camisa parece excesso de roupa. Mas, mesmo com este clima, não se pode ficar em casa. Eu, muito corajosa, lá saí. Quando estava de regresso, e passando pelo Largo de Santa Ana, resolvi vir por outra rua - porque tinha mais sombra. Mais meia dúzia de passos e, à minha direita, uma frutaria com ar de frescura. Entrei, só para conhecer o espaço, e dou de caras com uma senhora alta, forte, de sorriso rasgado, a perguntar-me se podia ajudar, "filha". Disfarcei e apontei para os abrunhos, são 3 por favor. Enquanto, muito solícita e despachada, foi buscar um saquinho de plástico, eu aproveitei para contemplar a fatiota: trazia umas socas cor-de-laranja garrido, sem meias; um vestidinho branco, pelo joelho; e, a cereja no topo do bolo, um avental com botões, gola revirada e manga pelo cotovelo, tudo com frutas desenhadas. Mas com cores, bonitas, com um aspecto muito festeiro e animado. Ainda eu não tinha tido tempo para chegar aos brincos, já ela tinha arrumado os abrunhos no saco e voltava para mim com perguntas. "Oh linda, atão e não bai mai' nada?". E mostrava maçãs daqui e ananáses inteiros noutra cesta. Depois levou-me aos morangos, deu-me um para provar que eram doces. "E são nancionais! Qu'a gente agora temos de comer o qu'é nosse". Então eu, porque os morangos eram 'nancionais', pedi-lhe uns 10. Deu-me 12, por causa das contas.Também fiz contas, não fazia ideia das moedas que tinha na carteira - só entrei para ver e já tinha dois sacos de fruta. Rematei por ali as compras, mas não consegui segurar-me quando vi caixas de cerejas no balcão. Ao meu olhar guloso, a Dona Fruta (é o melhor nome que lhe consigo arranjar) respondeu-me que já não tem. Que ainda houve, por alturas do Natal. Vieram numa remessa da Argentina, eram boas. Agora só volta a haver na época delas, lá para Junho. Mas o melhor é que eu vá passando, que sempre há qualquer coisa nova. E fez a conta. Tinha unhas cor-de-rosa choque, já com o verniz a cair, e carregava nos botões da máquina sem olhar. Continuou a explicar que às vezes tem assim negócios com a Argentina, porque eles têm lá coisas boas e há sempre quem lhas consiga trazer frescas. Que é como a fruta tem de ser, fresca. Despachou-me com 3€ e qualquer coisa e o típico 'volte sempre'. Ainda veio comigo à porta, muito airosa nas suas socas, gritar-me do meio da rua "BOM APETITE, FILHA!". E eu, sem manias de fineza, vim a roer abrunhos até casa.
5 comentários:
Muito bom! Quando o negócio com a Dona fruta meter cerejas, não te esqueças de mim!...
gosto da Dona Fruta!
que fome aqui se instalou!!
Martinha, quando houver cerejas eu compro extra e levo na quarta ;)
Spider Vaz, um dia destes levo-te a conhecer a Dona Fruta!!
abrunhos! ora aí está uma frutinha que nunca comi! parece-me bem. um dia destes vou visitr a Dona Fruta.
vou começar a aceitar encomendas!! quando lá voltar aviso todos os interessados/as! ;)
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