Agosto - Novembro

Já não vou ter o teu pelo beje espalhado nas minhas camisolas. Não tenho a quem atirar bolinhas de pão durante as refeições. Também perdi a companhia das noites a dormir no sofá. Não vou ter de andar com cuidado, à espera de te ver a sair de algum canteiro. Não vou precisar de fazer curvas enquanto caminho, pois não te vais atravessar nas minhas pernas. Agora atiro o queijo da sandes a quem? E, o que é feito da caixa de cartão onde passavas tardes inteiras a dormir? Porque é que o não há cordas e fios pelo chão? E já agora... porque é que foste para onde não devias ter ido? Aventuraste-te a atravessar a estrada. Correu mal. Raios, fiquei triste. Morreste. Mas, para mim, foste só fazer o teu passeio matinal. Demoras mais porque deves ter encontrado o gato malhado do vizinho. Não faz mal, eu espero. // A mãe disse que nunca mais quer gatos cá em casa. Ela é que te foi buscar à estrada. Ela é que te agarrou. Dizia ela que não quer mais gatos, porque se afeiçoa e depois lhe doi alma ir buscá-los, de pelo macio, à estrada. Milene, passaste 4 meses bem passados. Gostei de te ter por cá. Como a mãe diz: "Estava gordinha." Agora, raios. Naquela quarta-feira de nevoeiro deu-te para ir para a estrada. Quem deu o alerta foram os cães,(as vezes que tu te foste passear a frente deles, de nariz e rabo no ar), não paravam de ladrar e acordaram o pai que se deparou contigo e com os três vadios a uivarem à tua volta, qual guarda solene. Até aquelas bestas gostavam de ti. Olha, ligou agora a avó. Está triste: "Mataram a nossa bichaninha." Contei agora à Mafalda: "Coitada da nossa Solange Milene. Ao menos teve uma existência feliz connosco."
É verdade. Pode não ter durado muito. Mas chegas-te em Agosto Milene, escanzelada e mal tratada. Agora "estavas gordinha". E eu, pela primeira vez, estou a chorar por tua causa.